Sabrina Demozzi
No próximo dia 29 de setembro comemora-se o Centenário da morte de Joaquim Maria Machado de Assis, um dos maiores escritores brasileiros de todos os tempos. Para celebrar a data a Academia Brasileira de Letras fechou uma parceria com o Ministério da Cultura para lançar todos os livros do autor a preços populares (que deverão custar entre R$ 3 e R$ 5). No fim do ano, a ABL vai publicar um dicionário sobre a obra de Machado de Assis, sob direção de Ubiratan Machado. No mercado editorial, no segundo semestre, a Nova Aguilar publicará, em três volumes, a obra completa do autor.
É inegável a importância de um escritor como Machado de Assis para a história literária do Brasil, mas por que as pessoas conhecem tão pouco as obras do escritor? Já ouvi várias pessoas que tiveram de ler “Memórias Póstumas de Brás Cubas” no ensino fundamental considerarem a obra “chata” e “confusa”. Dias destes, um sujeito quis me convencer que o livro “nem é tão bom assim” e que não entende o porquê da idolatria em torno da figura do autor. Ora, um escritor como Machado de Assis não pode ficar relegado a uma compreensão prematura de um aluno no começo de sua formação educacional.
Vou citar a obra “Memórias Póstumas” por ser um dos livros mais populares do autor. Eu desafio o leitor deste blog a revisitar este livro. Esqueça as impressões que teve quando o leu no ensino fundamental. Este é um dos livros que precisam ser lidos nos dias de hoje; tanto pela sua atemporalidade quanto pela sua forma de concepção dos fatos. A irreverência no trato com os assuntos, a maneira de escrever, o modo com que Brás Cubas “fala” com seu leitor parecem muito com a forma de oralidade presente em blogs, mas com uma informalidade luxuosa, rica de detalhes e comparações. Poucas são as linhas deste livro que não trazem uma ironia fina e mordaz dos costumes à época, mas também do comportamento do ser humano. Brás Cubas é um dos personagens mais apaixonantes da literatura brasileira e depois que o livro acaba você se sente um pouco “órfão” da sua companhia.
Pode ser que algumas palavras não sejam familiares ao leitor, mas eu sugiro que se grife ou anote aquelas que são muito estranhas e ao final de um capítulo se investigue o significado da palavra. Parafraseando Nelson Motta “o Machado de Assis não jogava as palavras fora.” Isso é fato, o talento (um dos) de Machado está na imensa habilidade de construir os personagens de dentro para fora, ou seja, a complexidade dos seus personagens é muito grande.
Observe esta parte do capítulo IV sobre a idéia fixa de Brás Cubas:
“MINHA IDÉIA, depois de tantas cabriolas, constituíra-se idéia fixa. Deus te livre, leitor, de uma idéia fixa; antes um argueiro, antes uma trave no olho. Vê o Cavour; foi a idéia fixa da unidade italiana que o matou. Verdade é que Bismarck não morreu; mas cumpre advertir que a natureza é uma grande caprichosa e a história uma eterna loureira.”
Em seis linhas de texto ele diz mais do que muito escritor em duzentas. Note a ironia, a forma de procurar contato com o leitor (em forma de advertência sobre a idéia fixa), a opinião sobre a figura histórica e caricata do conde de Cavour (primeiro ministro do reino de Piemonte).
Em muitas passagens, durante as divagações de Brás Cubas, ele próprio satiriza as suas tentativas de comparações e da fragilidade das suas idéias: “Mal comparando, é como a arraia-miúda, que se acolhia à sombra do castelo feudal; caiu este e a arraia ficou. Verdade é que se fez graúda e castelã… Não, a comparação não presta.”
O espaço ficaria pequeno para demonstrar a magnitude da obra de Machado de Assis. Mas, quem quiser saber mais sobre o autor e sobre o centenário da sua morte pode acessar: http://www.cultura.gov.br e no canal de busca procurar por “Centenário de Machado de Assis.”
Para quem estiver disposto a revisitar as obras e está sem dinheiro para comprar os livros pode fazer o download grátis de vários livros, contos e crônicas no site http://virtualbooks.terra.com.br, basta ter o programa do ADOBE para ler as obras em PDF.
Para terminar, uma frase de Brás Cubas: “Lá iremos. Creio que prefere a anedota à reflexão, como os outros leitores, seus confrades, e acho que faz muito bem. Pois lá iremos. Todavia, importa dizer que este livro é escrito com pachorra, com a pachorra de um homem já desafrontado da brevidade do século obra supinamente filosófica, de uma filosofia desigual, agora austera logo brincalhona, cousa que não edifica nem destrói, não inflama nem regala, e é todavia mais do que passatempo e menos do que apostolado.”
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